quinta-feira, 15 de abril de 2010

Querido

Lembro bem da primeira vez que provei da dose amarga do amor findado. Lembrar de ti me sufocava. Fechar os olhos era tormento, pois meu desejo aparecia em sonho e sonhando acordada ficava imaginando minha vida se as coisas tivessem sido diferentes. E se, e se, e se... E se’s não servem pra nada quando nem ao menos se tenta, quando se foge covardemente do amor e da esperança, de se resgatar o sentimento já afogado em magoas e decepções.

Tu foste minha maior decepção. A partir de agora, nada que partir de ti será capaz de me iludir. Sei que quando se trata do nosso relacionamento também feri e também fiz sangrar, mas nada foi calculadamente pensado para machucar, como tu fizeste. Tenho consciência dos meus 50% de responsabilidades que constituem o 100% do nosso fracasso. Mas a ti, querido, faltou atitude para deixar o amor fluir, faltou dizer sim, ou não.

Depois do fim, passei dias na companhia de uma dor aguda, sofrível, com um sorriso despretensioso no rosto, como quem tenta se iludir que tudo está bem. Não estava, talvez nunca estivesse tudo bem, nem hoje. A culpa consumia minha já fraca e falha ilusão otimista; me perseguia sempre, onde eu e meus pensamentos estivessem.

Mas a culpa cedeu lugar à decepção quando tu reapareceste na minha vida. Tiraste as coisas do lugar, disseste o que queria para o meu ainda frágil e aberto coração. Possibilidade, chance, perdão, amor... Sim, sentimentos, aqueles todos, lembra? A flor da minha pele, mas só da minha... Do teu lado passei a ver egoísmo, egocentrismo, dúvida e confusão. Tu não sabias o que fazia, o que querias; ao passo que eu tinha certeza e nunca tive medo de arriscar e assumir.

Então tu te foste novamente, deixando dessa vez uma ferida ainda mais aberta a cicatrizar. Partiste sem medo ou com medo, e me deixou ali, frustrada, magoada, decepcionada, mais e mais decepcionada... Não entendo até hoje como foste capaz, como tivestes coragem, ou melhor, a falta dela. Dizem que o amor supera todos os obstáculos, dificuldades, traumas... Mas sem coragem não se enfrenta as dificuldades do amor, não se supera os traumas, nem se suplantam os obstáculos.

Pela última vez tu reapareceste, preferindo sua maldita omissão egoísta, calculando cada passo, sendo cruel. Mas agora, a melancolia que antes reinava soberana na minha paisagem, cedeu lugar à decepção, à cólera que pulsa a cada batida do meu coração. Vez ou outra o desânimo há de brotar, bem sei eu, mas, nunca mais, por ti, desejarei ser o silêncio depois da partida, a dor depois da morte, o vazio do mundo.

Não desejo que sofras como eu sofri, apesar de achar que seja inevitável. Quem não sabe enfrentar o que sente certamente terá problemas no coração e sofrerá ainda mais. Mas que as palavras ditas aqui ecoem pelo tempo, entregues ao alento, a espera de ouvidos que estejam dispostos a escutá-las... Pois o que digo sai do fundo da minha alma, do orgulho ferido, da minha esperança que nunca se exaurirá.

Estou certa de que nada disso será em vão, pois a mim, não basta um suspiro de vida. Eu a quero por completo. Eu quero uma vida de intensidades.

Desejando que encontre o amor algum dia, despeço-me corajosamente deste que, num passado pouco distante, foi o amor que senti por ti.

C.






Figura: Quadro de Pablo Picasso, Nudez Azul.

6 Comentários:

Às 16 de abril de 2010 às 05:57 , Blogger . disse...

Acho que foi o seu melhor até o momento!
De ficar sem ar. E acho que muitas podem se identificar com ele.

Acho que isso é o mais lindo de prosas e poesias. Ver que, sendo verdadeira, conseguiste alcançar o sentimento e a realidade de outros..

 
Às 17 de abril de 2010 às 06:54 , Blogger Monique disse...

entendo exatamente o que cada palavra descreve
=/

 
Às 19 de abril de 2010 às 23:42 , Blogger Vanessa Souza disse...

Não nos iludamos, cada decepção é única...

 
Às 21 de abril de 2010 às 02:27 , Blogger Pequenos causos disse...

Nossa, Mila...
É um ensaio sobre encontros e desencontros, amor e desamor!!
Realmente é de ficar sem ar...

 
Às 24 de abril de 2010 às 23:30 , Blogger Fabio Rocha disse...

o amor, sempre o amor...

belo texto.

beijo enorme

 
Às 25 de abril de 2010 às 07:43 , Blogger Deise Anne disse...

dizer umas verdades necessárias faz sempre muito bem. a gente se resolve consigo mesmo e coloca o que nos faqzia mal pra fora.

continue pensando assim: e se... não serve pra nada.

beijos e ótimo fds! :)

 

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